O Decreto-lei nº 241/2007, de 21 de Junho, veio definir o regime jurídico aplicável aos bombeiros portugueses no território nacional. Na esteira do revogado Decreto-lei nº 295/2000, de 17 de Novembro, também o DL 241/2007 consagrou um capítulo dedicado ao regime disciplinar, dedicando-lhe 6 parcos artigos, num dos quais se prevê, uma vez mais, a aplicação subsidiaria aos bombeiros voluntários do “Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local” (aprovado pelo revogado Decreto-lei nº 24/84, de 16 de Janeiro).
A 31 de Julho de 2008 entrou em vigor o Regulamento Disciplinar dos Bombeiros Voluntários, anexo à Portaria nº 703/2008, de 30 de Julho. Quando se esperava que este fosse um regulamento disciplinar com cabeça, tronco e membros, e traduzisse o corte do “cordão umbilical” com o regime disciplinar vigente na administração pública, consagrando uma verdadeira autonomização e regulação processual, a desilusão instalou-se !
Em bom rigor, o Regulamento Disciplinar dos Bombeiros Voluntários limita-se a uma abordagem insípida, incompleta e, por vezes, incongruente da problemática de um regime disciplinar, descurando a imprescindível abordagem processual do procedimento propriamente dito. Com efeito, a Portaria nº 703/2008, persistindo numa relação de excessiva subsidiariedade com o estatuto disciplinar da administração pública (Lei 58/2008, de 9 de Setembro), não dispõe sobre as várias fases processuais, nomeadamente sobre as de instrução e de defesa, suscitando compreensíveis dificuldades de interpretação, enquadramento e aplicabilidade à especificidade dos bombeiros voluntários de um regime criado e dedicado a trabalhadores que exercem funções públicas.
Como se não bastasse a manutenção desta relação de dependência, a inexistência de sólida formação em processos disciplinares dos potenciais instrutores (elementos de comando, oficiais e graduados), agravam as dificuldades com que estes se deparam ao “materializar” as disposições dos articulados, propiciando constantes irregularidades e atropelos de direitos, e, na maioria das vezes, condenando os processos a nulidades insupríveis.
Por outro lado, à dificuldade de interpretação e conjugação do regulamento disciplinar com os demais diplomas que lhe são subsidiários, acresce o facto de os instrutores, e igualmente os bombeiros-arguidos, não terem ao seu dispor nenhuma espécie de apoio jurídico na tramitação processual e na defesa, não obstante este já ter sido proposto em 2009 a quem de direito.
Porém, ressalvando os corpos de bombeiros que têm nas suas fileiras licenciados em Direito, a grande maioria dos instrutores que pretenderão instruir, de forma minimamente correcta, um processo disciplinar vêem-se na contingência de recorrer ao apoio de juristas externos conhecidos, ou não, que, não obstante por vezes serem desconhecedores da totalidade dos factos, darão a sua melhor orientação.
Contudo, certamente por desconhecimento, lamentavelmente, continuam a ser praticados verdadeiros atentados aos princípios elementares e regras que orientam o procedimento disciplinar, nomeadamente no que concerne aos aspectos processuais relacionados com a acusação, direitos de defesa e recurso dos bombeiros-arguidos.